6 - do tempo em ser analógico
uma reflexão sobre o Tempo e lembranças antes da internet acelerada
Escrevendo pela internet afora é que me pego pensando em voltar ao analógico para poder resgatar em mim lembranças de tempos anteriores, em que o Tempo era mais nosso e menos da internet.
Ela anda tão acelerada e cada vez mais a gente é conectado à tecnologia que dá para esquecer de quando não tínhamos isso 30 anos atrás. Às vezes parece que não consigo lembrar como era não ter um computador e como a gente falava por telefone discado e escrevia cartas ao invés de mandar mensagens em chats e DMs em redes sociais.
Já falei tanto sobre como uma vida online pode ser bem frustrante. Sempre há algo a se comparar para ver o quanto ela nem sempre é uma ferramenta de ajuda. Embora ela seja muito boa para muitas coisas, é também na vida online que se molda um jeito de viver que te prende mais do que liberta – na maioria das vezes, ao meu ver. Com ela vem todos os receios, desconfianças e ansiedades que se pode ter.
Entretanto é nele, no online, que nos apoiamos para divulgar trabalhos e ofícios. Principalmente quem escreve como eu, imagino que para o hoje seja um meio muito rápido e simples de mostrar o que a gente faz. Mesmo que seja bem frustrante em como não temos importância nenhuma diante desse espaço tão infinito ao mesmo tempo tão limitado diante de algoritmos nos seguram.
Há muitos que resgatam esses sentimentos com coleções de artefatos analógicos, como discos de vinis e máquinas de escrever. Bom, temos o bom e velho caderno e caneta, da qual sou muito adepta desde sempre. Apesar de gostar demais do meu Kindle, jamais substituirá para mim, na minha vida, o livro físico. Até por questões afetivas, né? Não é só o livro físico em si, mas tudo o que ele representa.
É nesse hábito de escrever à mão, em detalhes como escolher uma caneta que se adapte bem na minha mão – mesmo que não vá impedir o calinho que se forma no dedo médio, pela caneta ficar apoiada nele por muito tempo nessa escrita – que me apego o máximo possível para não esquecer de como o Tempo passa diferente quando nos dedicamos a atividades analógicas, sem depender de uma vida online para pensar em ser alguém.
Tento muito ficar longe daqui, mas é difícil, como disse, pois é preciso divulgar o que se faz, e eu só tenho esse lugar ao meu favor. Porém sempre paro para pensar em como o Tempo era quando não tinha acesso a internet. O que eu fazia? Com o que me distraía? Aí me vem as memórias de quando passava tanto tempo sentada na escrivaninha desenhando ou escrevendo em meus cadernos até cansar. Saía muito para andar pelo centro da cidade (Cruz Alta, pequena mas boa para andanças e conversas com amigas que gostavam das mesmas coisas que eu) ou no calçadão, como chamávamos os arredores mais movimentados lá da minha cidade. Claro que eu assistia muita TV e lia nas horas em que não estava na escola, mesmo com esse contato de uma tecnologia, estar completamente fora do online, faz com que o tempo que percebo seja completamente diferente.
Ele parecia passar mais devagar e por isso mesmo a impressão era de poder fazer mais coisas em menos tempo. Mas lá no fundo a gente sabe que o Tempo é o mesmo e que é nosso modo de vida que muda. É uma evolução, afinal, mas a que custo? Não se tem uma resposta, penso eu. Precisa-se evoluir e usar do que essa evolução proporciona, mas não é demérito nenhum querer trazer para si, num ato saudoso, o que faz lembrar da época com mais Tempo.
Nisso eu planejo adquirir, na medida do possível, esses artefatos que me lembram usar o tempo a meu favor. Uma caneta tinteiro; quem sabe uma máquina de escrever. Ainda me reservo o direito de comprar cadernos e outras canetas para continuar usando papel para registrar meus pensamentos e minha vida.
Em algum momento também queria poder voltar a escutar mais música de modo analógico, com discos. Sobretudo por gostar demais de música, acho que vale o investimento. Claro que tudo isso custa $, mas vou priorizando algumas coisas e deixando outras. Nesse resgate o importante, também, é a sensação de libertação de uma prisão tecnológica.
Não quero soar ingrata a essas invenções, nem posso, até porque estou aqui usando um computador, a internet para me comunicar com tantas pessoas. Além de usar celular e apps para me comunicar e apreciar artes, é que só quero resgatar um pouco mais dessa época que sei não voltará mais. Ainda que me dedique a mandar cartas, escrever em cadernos e passar tempo cuidando das minhas plantas, vou continuar dentro desse mundo online, não adianta. Pelo menos são experiências que posso contar nesses textos que envio esporadicamente.
Falei de caneta tinteiro, dos discos, até da máquina de escrever, pois vejo muita gente que curte escrever e ouvir música entrando nessa de investir novamente nessas mídias analógicas para algum propósito. Não sei se é o mesmo que o meu, mas com certeza é a mesma saudade dos velhos tempos que conservo.
uma observação: não é necessário gastar ou consumir coisas para que se aproveite uma vida mais “analógica”, mas o que eu quis dizer aqui é como usamos esses objetos para deixar de estar online por um tempo, fazendo nossa arte e/ou trabalhando nela.
Parece que o movimento de coleciona-los anda mais forte, ou sou eu que me introduzi nesse meio, meio sem querer, hehe. De qualquer modo gosto de ver e acompanhar quem mostre suas atividades envolvendo esses hobbys. Pelo menos podemos usar as redes sociais a nosso favor procurando por contas que valorizam essas práticas e atividades. Eu gosto muito.
Algumas indicações
Gostei dessa caneta tinteiro — uma Lamy, como comentei na edição anterior que Neil Gaiman usava, queria ter uma exatamente dessa marca (aquelas).
Tenho alguns modelos de cadernos da Cícero e acho eles muito bons. A qualidade do papel é ótima para uma escrita fluida e macia. Esse aqui provavelmente será minha próxima aquisição.
Sigo algumas contas no Instagram que colecionam e vendem máquinas de escrever. Ainda não sei qual meu modelo preferido, há tantos. Em algum momento decido e planejo em ter uma.
Quero muito que meus “segundos” discos de vinil (tenho um do a-ha, esse foi meu primeiro) sejam um desses dois da Florence. Existem sebos aqui em São Paulo que talvez vendam esses um pouco mais em conta.
Bom, por hoje é isso. Espero que tenham gostado, se quiserem comentar algo, vou adorar.
Até a próxima!
Que texto gostoso. Quando li Tempo deixei ele guardado para ler com calma, e assim o fiz, depois do meu café da tarde. É por isso mesmo que decidi encadernar e estudar gravura: quero estar mais perto de um mundo artesanal, mesmo que viva online me comunicando com gente distante e compartilhando o que faço. Se pudesse, ou melhor: quando puder, a internet será apenas uma vitrine para o mundo lá fora. Também me lembro pouco do tempo analógico, foram treze anos assim. Não imaginava, mas digo hoje: que saudade! E fico feliz de o Louis aparecer na sua lista de indicações, é muito apaixonado pelas máquinas. Preciso criar uma rotina de escrever mais à mão (voltei a escrever cartas, se quiser me mande mensagem!) e à máquina. Acho um luxo aqueles quartinhos de escritor onde tem exatamente isso: uma mesa, uma cadeira, uma janela. Na mesa, papéis, caneta e tinta. Ou papéis e máquina. SÓ. No máximo o livro do momento. Um dia terei esse cantinho. Posso ser maximalista de tudo, mas nesse cantinho quero ser a maior das minimalistas hahaha. E vamos escrever sempre!
Também sinto saudades o tempo analógico. O que ando fazendo é diminuir tempo de tela, sobretudo, redes sociais. Tem sobrado tempo, vale a pena. Um abraço!